terça-feira, 1 de novembro de 2011

Pacto Amazônico e Projeto Oi Futuro.

Projeto Sustentabilidade na Floresta realiza atividades de capacitação, educação e informação ambiental. Mobilização na Comunidade do Flexal em 13/10/2011, vejam as fotos. Acompanhe a agenda 15/10 - Implanação da FOFA na Comunidade Buiuçu 19/10 - Mobilização na Comunidade Paraizinho 25/10 - Implantação da FOFA na Comunidade do Flexal 26/10 - Implanação da FOFA na Comunidade Paraizinho

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Projeto Sustentabilidade na Floresta realiza atividades de capacitação, educação e informação ambiental.









Projeto Sustentabilidade na Floresta realiza atividades de capacitação, educação e informação ambiental.

O projeto Sustentabilidade na Floresta, do Instituto Pacto Amazônico, está realizando diversas atividades de capacitação, educação e informação ambiental para sete comunidades do interior do Amazonas e entorno da Flona de Humaitá. A iniciativa, que foi selecionada pelo Programa Oi de Patrocínio de Projetos para o Meio Ambiente, prevê ainda a construção de quatro viveiros temporários para ações de recuperação de áreas alteradas nas comunidades atendidas.

Sobre o Programa Oi de Projetos para o Meio Ambiente

O Programa Oi de Projetos para o Meio Ambiente é uma iniciativa da Oi, através do seu instituto de responsabilidade social Oi Futuro - http://www.oifuturo.org.br, de apoio a ações de preservação e conservação do meio ambiente, de todas as regiões do país. O programa, lançado em 2010, financia projetos de organizações sem fins lucrativos e devidamente legalizadas. O processo de seleção é realizado através de edital aberto anualmente, que utiliza como critério quatro linhas de atuação, são elas: novos empreendimentos que integrem a sustentabilidade e a conservação ambiental; apoio à implementação e/ou fortalecimento de tecnologias sociais que promovam o desenvolvimento sustentável e a conservação do meio ambiente; uso de novas tecnologias para preservação ambiental; e educação para a sustentabilidade.

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Pacto Amazonico e OI FUTURO

Projeto Sustentabilidade na Floresta realiza atividades de capacitação, educação e informação ambiental



O projeto Sustentabilidade na Floresta, do Instituto Pacto Amazônico, está realizando diversas atividades de capacitação, educação e informação ambiental para sete comunidades do interior do Amazonas e entorno da Flona de Humaitá. A iniciativa, que foi selecionada pelo Programa Oi de Patrocínio de Projetos para o Meio Ambiente, prevê ainda a construção de quatro viveiros temporários para ações de recuperação de áreas alteradas nas comunidades atendidas.



Sobre o Programa Oi de Projetos para o Meio Ambiente



O Programa Oi de Projetos para o Meio Ambiente é uma iniciativa da Oi, através do seu instituto de responsabilidade social Oi Futuro, de apoio a ações de preservação e conservação do meio ambiente, de todas as regiões do país. O programa, lançado em 2010, financia projetos de organizações sem fins lucrativos e devidamente legalizadas. O processo de seleção é realizado através de edital aberto anualmente, que utiliza como critério quatro linhas de atuação, são elas: novos empreendimentos que integrem a sustentabilidade e a conservação ambiental; apoio à implementação e/ou fortalecimento de tecnologias sociais que promovam o desenvolvimento sustentável e a conservação do meio ambiente; uso de novas tecnologias para preservação ambiental; e educação para a sustentabilidade.

quinta-feira, 31 de março de 2011

NÃO ESTAMOS LIGADOS...

30/03/2011 - 12h03


Conjuntura da Semana: A rebelião de Jirau

Por Redação IHU

A análise da conjuntura da semana é uma (re)leitura das "Notícias do Dia" publicadas, diariamente, no sítio do IHU. A análise é elaborada, em fina sintonia com o Instituto Humanitas Unisinos - IHU, pelos colegas do Centro de Pesquisa e Apoio aos Trabalhadores - CEPAT - com sede em Curitiba, PR, parceiro estratégico do Instituto Humanitas Unisinos - IHU.


Eis a análise.

A rebelião de Jirau

O maior canteiro de obras do Brasil, localizado no sítio do Jirau, cidade de Porto Velho em Rondônia, ardeu em chamas no dia 15 de março e em poucas horas virou cinzas. Alojamentos e ônibus foram queimados ou destruídos, além do posto de saúde, de escritórios e do almoxarifado. A destruição do canteiro de obras foi resultado de um levante operário. 22 mil trabalhadores estavam envolvidos na construção da usina que forma o complexo hidrelétrico do Madeira junto com a usina de Santo Antônio.
Os acontecimentos em Jirau são significativos porque é a maior obra em andamento do Programa de Aceleração do Crescimento – PAC e síntese do modelo desenvolvimentista que reedita o projeto de um Brasil grandioso como à epoca de Vargas, JK e o período militar. Um modelo baseado em grandes obras, sobretudo de exploração energética com vistas a suprir o gigantismo consumista de energia de uma nação emergente exportadora de commodities.

Jirau é significativo por outro aspecto, situa-se na Amazônia legal, região em que se desbrava a última fronteira do capitalismo brasileiro. É na Amazônia legal que se trava a luta para amansar os grandes rios – Madeira, Xingu, Tapajós, Teles Pires – e sujeitá-los ao projeto desenvolvimentista. Jirau, nessa perspectiva, também é importante porque é revelador de uma concepção de desenvolvimento que dá as costas para a questão ambiental. Jirau é um filme já visto - Itaipu, Balbina, Tucuruí – e antecipa Belo Monte.

A questão, porém, mais impressionante de Jirau é a questão social. A explosão da revolta operária contesta o modelo do Brasil moderno. Direitos desrespeitados, truculência e autoritarismo das empreiteiras, sofrimento imposto aos trabalhadores é o outro lado da história que ninguém viu e percebeu. Empreiteiras, sindicatos e governo ficaram surpresos com a revolta que truncou o acelerado andamento do projeto.

Jirau se insere na lógica da modernização conservadora e manifesta todas as contradições do país, ou seja, por um lado revela a pujança e o vigor do crescimento econômico, por outro, produz no seu entorno exploração e miséria. Jirau diz respeito ao Brasil potência – 8º PIB da economia mundial e o 73º IDH - incapaz de mitigar os efeitos do seu gigantismo.

Em Jirau a questão social e a questão ambiental estão relegadas em segundo plano. Jirau coloca em xeque o modelo desenvolvimentista e também o governo de esquerda de Dilma. Jirau reproduz os mesmos erros dos militares onde o social não entra e menos ainda o ambiental. A diferença agora é que no lugar das tropas militares, ocupam o canteiro de obras a Força Nacional – agrupamento policial especializado em combater motins.

Jirau interpela também o movimento social, a esquerda militante, as pastorais, os sindicatos, os ambientalistas. A repercussão dos acontecimentos de Jirau foram poucas e esparsas. Os sites de organizações sociais, dos movimentos, das ongs pouco falaram de Jirau. Encontra-se mais e farto material dos acontecimentos do Japão e da Líbia do que aconteceu no norte do Brasil. Como destacou o jornalista Jânio de Freitas, “a violência assumida pela revolta em Jirau (RO) e pela dos árabes tem semelhança, mas as recepções aqui, aos dois casos, foram opostas”.
A revolta operária em Jirau também pouco sensibilizou os ambientalistas e suas organizações. Céleres em denunciar, organizar manifestos e repercutir agressões ao meio ambiente, as organizações ambientalistas pouco falaram da questão social de Jirau. Percebe-se uma grande dificuldade do movimento ambientalista em conectar os temas sociais aos ambientais. A abordagem faz-se geralmente de forma isolada.

Compreender, portanto, o que acontece em Jirau auxilia na compreensão do que vem se transformando o Brasil e contribui para uma análise autocrítica da esquerda.


A questão social. Jirau vivia sob tensão reprimida
A revolta dos milhares de operários no canteiro de obra em Jirau transformando tudo em terra arrasada pegou todos de surpresa, empreiteiras, sindicatos e governo. O consórcio Energia Sustentável do Brasil – ESBR formado pelas empresas Suez Energy, Eletrosul, Chesf e Camargo Corrêa – responsável pela obra se disse surpresa com a insurreição que qualificou como ação de vândalos. Segundo o consórcio "tudo estava tranquilo". “Não havia descontentamento”, disse Victor Paranhos, presidente do Energia Sustentável do Brasil. "É preocupante porque não sabemos qual é a motivação. Não há sequer uma liderança", afirmou perplexo.

Na realidade não “estava tudo tranquilo” como diz o Consórcio. “Jirau vivia sob tensão reprimida', afirmou o Ministério Público do Trabalho de Rondônia após os acontecimentos. Segundo o Ministério, a quebradeira nos canteiros de obras foi resultado de uma "tensão longa e reprimida" nos alojamentos isolados na floresta amazônica.

É importante destacar que conflitos anteriores já tinham acontecido. Em julho de 2010, o canteiro de obras da usina de Santo Antônio virou um campo de batalha. As péssimas condições de trabalho e a super-exploração da mão-de-obra levaram a ações similares as que aconteceram nos últimos dias em Jirau com ônibus apedrejados e queimados e parte do alojamento depredado.

A tragédia em Jirau foi anunciada. Dias antes de eclodir o conflito, Maria Ozânia da Silva da Pastoral do Migrante de Rondônia concedeu entrevista à IHU On-Line onde relatava desrespeito aos direitos dos trabalhadores. A entrevista foi publicada um dia antes dos acontecimentos como que prenunciando os fatos. O relato de Maria Ozânia é importante porque revela que muitos trabalhadores já haviam sido enganados por “gatos” antes de chegar ao canteiro de obras.

Milhares de vagas do canteiro de obra da usina hidrelétrica de Jirau foram preenchidas por migrantes que receberam promessas de "gatos" - agentes que intermediam mão-de-obra. As construtoras recorrem às mesmas práticas de recrutamento de trabalhadores dos tempos do "Brasil Grande", nos anos 70, quando o

País viveu um surto de desenvolvimento econômico no período do regime militar.

Porém, os “gatos” dos anos 2000 sofisticaram os mecanismos de exploração envolvendo o Sistema Nacional de Emprego – Sine, cobrando taxa para garantir o emprego – utilizando-se de boleto bancário – e responsabilizando os próprios trabalhadores pelo pagamento do seu deslocamento e alojamento até a contratação definitiva. Milhares começaram trabalhando sentindo-se enganados. O ganho médio de um trabalhador de Jirau gira em torno de R$ 1.000,00.

No canteiro de obra surgiram outros problemas: não pagamento de horas extras; falta de pagamento de benefícios e participação dos lucros; diferenciação de salários entre as empreiteiras; truculência dos seguranças; falta de pagamento da "hora itínere" – tempo gasto pelo trabalhador sem alojamento para chegar a um local de trabalho distante; custos alto de medicamentos; desrespeito ao cumprimento da "embaixada" – período em que o trabalhador visita a família, entre outros.
"Fui descobrir aqui que a Camargo Corrêa não paga hora extra. Você acha que eu iria vir para trabalhar só oito horas? Ficar fazendo nada o resto do dia?", questionou José Benedito Cotrin, de Abaetetuba (PA). Outro trabalhador, disse que a empresa se recusava a pagar a viagem de volta dos que pediam demissão e que o local é um "presídio em que o trabalhador controla o horário do banho de sol".
A queixa, aliás, da truculência dos seguranças do canteiro é uma das que mais ficou latente: "Os seguranças não sabiam conversar. Nos finais de semana, quando o pessoal passava um pouquinho da conta na bebida, eles tratavam os bêbados na pancada, como vagabundos", relata Antônio César Souza da Silva de Belém (PA). Muitos trabalhadores de Jirau dizem ter sofrido 'violência física' por parte de funcionários da Camargo Corrêa e que eram obrigados a comprar produtos a preços exorbitantes no canteiro da obra.

Uma disputa entre sindicatos ligados à CUT e à Força Sindical também teria contribuído na deflagração dos conflitos. O Sticcero (Sindicato dos Trabalhadores na Indústria da Construção Civil de Rondônia) criado em 1986 é filiado à Central Única dos Trabalhadores – CUT e o Sintrapav-RO (Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção Pesada de Porto Velho) criando em 2008 é ligado à Força Sindical. Ambos disputam a representatividade da categoria. O Sticcero acusa o sindicato adversário de incentivar o quebra-quebra. "O clima entre os sindicatos não está bom. Eles estão brigando na Justiça para saber quem tem representatividade", afirmou o procurador regional do Trabalho de Rondônia Francisco Cruz. Reduzir, entretanto, como setores da imprensa propagam os conflitos em Jirau à briga de sindicatos é simplificar o problema que como se viu tem razões sociais.

Sobre as condições de alojamento há controvérsias. Não chegou a ser apontado como um dos principais problemas. Muitos deles eram climatizados, algo anunciado por Lula num discurso para os operários de Jirau, em agosto do ano passado: "Isso [ar condicionado nos alojamentos] demonstra que os trabalhadores vão aprendendo a conquistar seus direitos, os empresários vão aprendendo que é importante que, quanto mais conforto, mais os trabalhadores produzem e assim a gente vai mudando a cara do nosso País", afirmou Lula na época. Destaque-se, porém, que o tratamento não era o mesmo dispensado a todos os trabalhadores. Assim como havia diferenciações salariais dentro do mesmo canteiro em função de várias empresas terceirizadas, as condições de alojamento não eram necessariamente a mesma para todas.
A tentativa de desqualificação – “coisa de vândalos” – do levante operário por parte das empreiteiras e o discurso similar do governo não se sustentam. A revolta operária em Jirau é uma questão social. “Uma coisa dessa magnitude não acontece sem um motivo forte. Ninguém se mobiliza dessa forma apenas em função de uma briga entre dois funcionários”, diz Elias Dobrovolski do Movimento dos Atingidos por Barragens - MAB, em Rondônia.

O jornalista Leonardo Sakamoto, lembra que uma fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego, no ano passado, produziu 330 autos de infração e a interditou equipamentos que estavam colocando em risco os trabalhadores da obra. Destaca ainda que um grupo de 38 pessoas foi libertado de trabalho análogo à escravidão pela Superintendência Regional do Trabalho e Emprego de Rondônia. As vítimas estavam trabalhando para a Construtora BS, que prestava serviço ao consórcio responsável pela construção de Jirau.

A luta por respeito e dignidade
A revolta de Jirau, entretanto, não se deu apenas por melhores condições de trabalho e salários. Relatos colhidos pelo Ministério Público do Trabalho de Rondônia dão conta de que parte importante das reivindicações dos trabalhadores é por respeito e dignidade. Entre as reclamações ouvidas pelo Ministério do Trabalho encontram-se:
1 - Fim da truculência de seguranças e encarregados - xingamentos, empurrões, cárcere privado temporário e piadas;
2 - Tratamento respeitoso aos trabalhadores que chegarem aos alojamentos alcoolizados. A dependência de álcool é vista como uma doença;
3 - Respeito na relação entre o "sala fria" e o 'peão", sem assédio moral. Em Jirau, "sala fria" é o funcionário que trabalha em salas com ar-condicionado;
4 - Pagamento por "hora itínere" - o tempo de viagem para canteiros de obras fora do perímetro urbano (só para quem não mora em alojamentos). Flexibilidade no transporte de áreas de trabalho isoladas para centros urbanos nas horas de folga;
5 - Serviços eficientes nos refeitórios, para evitar que o tempo da fila do bandejão não consuma boa parte do período do almoço. Refeições adequadas e alojamentos higiênicos;
6 - Garantia aos que trabalham em locais isolados e distantes de casa do pagamento e do cumprimento da "embaixada" - período em que o trabalhador visita a família;
7 - Cumprimento das promessas feitas pelo agenciador de trabalho;
8 - Pagamento de hora extra;
9 - Pagamento de cesta básica que leve em conta os preços do comércio local;
10 - Indicação de representantes da empresa para ouvir denúncias contra outros funcionários.

Muitas das reclamações relacionam-se às exigências por respeito. As novas gerações de trabalhadores vêm de cidades sem escolas de qualidade e cursos de profissionalização, porém, são do tempo da universalização do ensino e das febres das lan houses e do celular pré-pago. Ligados de alguma forma ao "mundo" de jovens de outras classes sociais e lugares por meio da web e do telefone, esbanjam demonstrações de personalidade e consciência de seus direitos, destaca reportagem do jornalista Leonencio Nossa.

A diferença dos "peões" dos anos 90 em relação aos demais é nítida na postura firme e no orgulho de se vestir bem, diz o jornalista em sua reportagem. "Não gosto de desvalorizar ninguém, mas é bom demais andar assim", diz Dabson Bernardes Ferreira, 20 anos, de Breu Branco, no Pará, vestido com camiseta vermelha com estrelas, calça jeans justa, tênis, colar de metal com a letra "D", brinco, pulseira e cabelos bem cortados. "Se eu pudesse, não botava macacão. Iria desse jeito para a obra”.

Outro caso apresentado pelo jornalista é o de Antônio Carlos Pereira, 19 anos, paraense "legítimo", como se apresenta. Antônio assume a vaidade. "Nunca disse que sou mais do que alguém. Meus colegas me conhecem. Mas nessa parte de roupa, ah, velho, eu não minto. Só saio legal", diz. Ele lamenta ter perdido mochila com roupas coloridas e o tênis que usava nos finais de semana na Dimpo, boate de música eletrônica - e que consumiam boa parte do salário de R$ 1.100. "Estava de uniforme no dia do incêndio. Estou vestindo agora roupa de um colega", diz. Conseguiu salvar anéis, pulseira, colar e brinco. "Passei a usar brinco aqui. Se usasse no Pará, o velho cortava a minha orelha."

O caos social no entorno de Jirau

A questão social de Jirau não se resume aos problemas vivenciados no canteiro de obras, extrapola para os seus arredores. “Pelo amor a Deus, usem seu poder e sua influência para fazer o que for possível para diminuir os efeitos sociais negativos desse empreendimento, pois amanhã, os que lucram hoje sofrerão na pele suas conseqüências", apela o Pastor Aluizio Vidal, presidente Regional do PSOL – RO, sobre o caos que vive Jaci-Paraná, cidade vizinha à obra. O pastor e político dá o seu testemunho: “Vi naqueles bares à beira do asfalto, entre uma quantidade inumerável de homens, mulheres jovens se oferecendo à prostituição, muita bebida, muita música e imaginei a quantidade de coisas indizíveis que acontecem ali e reconheço que também são parte do que está sendo produzido pelas usinas”.

A região das obras das hidrelétricas de Jirau e Santo Antônio, em Rondônia, registra uma explosão de criminalidade e de casos de exploração sexual de crianças e adolescentes. O aumento dos problemas supera o ritmo do crescimento populacional. As usinas começaram a ser construídas no segundo semestre de 2008. A população de Porto Velho, onde estão as duas obras, cresceu 12,5% entre aquele ano e 2010. O número de homicídios dolosos na capital aumentou 44% no mesmo período. Para o promotor Aluildo de Oliveira Leite, que acompanha o impacto das obras, o efeito social das obras foi "subdimensionado". A ampliação do hospital de base da cidade, que era prevista, não foi concluída.

Segundo Raiclin Silva, do Juizado da Infância, as áreas próximas aos canteiros tinham participação mínima nos resgates de menores e agora são metade do total. O número de estupros em Rondônia cresceu 76,5% de 2008 a 2010. A quantidade de crianças e adolescentes vítimas de abuso ou exploração sexual subiu 18% no período. Mais de 37 mil funcionários, na maioria homens vindos de outros Estados, trabalham nas duas obras. "É como se houvesse um garimpo", diz Silva.

“Jirau é um sinal de alerta ao governo e seus empresários”, diz nota da Aliança dos Rios da Amazônia, composta pelos Movimento Xingu Vivo para Sempre, Aliança Tapajós Vivo, Movimento Rio Madeira Vivo e Movimento Teles Pires Vivo. Segundo os movimentos, “Jirau concentra todos os problemas possíveis: em ritmo descontrolado, trouxe à região o ‘desenvolvimento’ da prostituição, do uso de drogas entre jovens pescadores e ribeirinhos, da especulação imobiliária, da elevação dos preços dos alimentos, das doenças sem atendimento, e de violências de todos os tipos”.
Empreiteiras, governo e sindicatos. Reação tardia
As empreiteiras, o governo e os sindicatos surpreenderam-se com a revolta em Jirau. Não esperavam os acontecimentos e depois de uma tentativa de desqualificar o caráter da rebelião de lutas por direitos, correm agora atrás do prejuízo. A procura por soluções rápidas não é apenas por sensibilidade para com a questão social. O governo teme sobretudo que Jirau repita-se em outros canteiros de obras do PAC.

Destaque-se que 80 mil operários da construção civil estavam parados, nos últimos dias somados os profissionais que atuam nas hidrelétricas de Jirau e Santo Antônio, em Porto Velho (RO), além dos complexos portuários de Suape (PE) e Pecém (CE).

A primeira reação do governo aos conflitos de Jirau foram reativas. Depois de ouvir a Camargo Corrêa e avaliar as informações do Ministério das Minas e Energia e dos relatórios da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), o Planalto decidiu mobilizar um contingente da Força Nacional e da Polícia Federal para assumir o controle dos canteiros da construtora na usina hidrelétrica de Jirau, em Rondônia. Cerca de 600 homens da Força Nacional de Segurança foram enviados para Rondônia e serão mantidos na região por tempo indeterminado.

A Camargo Correa responsável pela obra e assustada com a rebelião, assinou um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) com o Ministério Público do Trabalho para garantir salário, alimentação e hospedagem para os trabalhadores que quisessem permanecer em Rondônia. Ao mesmo tempo passou a organizar a retirada dos trabalhadores. Dois aviões e 200 ônibus foram fretados para encaminhar mais de 7.000 trabalhadores das obras de Jirau a seus Estados de origem. Apesar do acordo, os trabalhadores que permanecem encontram-se em condições precárias.
Passado as primeiras horas e o susto, as empresas assumiram um novo discurso: querem a parceria do Estado na segurança. O presidente do consórcio responsável por Jirau, o Energia Sustentável, Vitor Paranhos, defendeu que obras privadas de grande porte, como a usina, tenham a segurança dos canteiros garantida por forças públicas. "Jirau tem 20 mil pessoas. Isso é uma população maior que a de muitas cidades. E o que será feito quando formos fazer Belo Monte [PA] e for preciso cuidar de 30 mil peões no meio do nada? Não basta chegar para o investidor e dizer: "Problema seu"."
O Presidente da Construtora Camargo Corrêa, Antonio Miguel Marques foi ainda mais explícito: “A Camargo Correa só vai retomar as obras se julgar que existem plenas condições de segurança para todos os seus empregados. Neste momento a Força Nacional se faz presente no acampamento, o que dá uma certa tranquilidade para a retomada”.
Além do dinheiro público para a construção, as empreiteiras querem agora segurança pública permanente para prosseguir as obras.

Pacto pelo PAC

O governo do seu lado passou a articular uma agenda preventiva. Articulou uma reunião com as centrais sindicais, empresas concessionárias e Ministério Público do Trabalho para tentar chegar a um pacto e impedir um colapso no principal programa de investimentos do governo.

As centrais passaram a assumir uma postura reivindicativa: “Estamos cobrando medidas de garantia do trabalho decente, as contrapartidas sociais, em todas as obras e projetos financiados por dinheiro público, há vários anos. Nós precisamos estabelecer mecanismos eficazes, como fiscalização permanente e punição severa para as empresas que tomam dinheiro público emprestado mas que não respeitam os direitos dos trabalhadores, não respeitam a representação sindical”, disse o presidente da CUT, Artur Henrique, ao cobrar providências do governo federal, durante audiência.
Por outro lado e apesar do discurso de indignação, a CUT enviou representante a Porto Velho para conversar com o sindicato local e segundo a imprensa defendeu a posição do governo federal e das construtoras. O representante da CUT nacional Vagner Freitas defendeu a volta dos operários ao trabalho. "Tem de voltar a trabalhar. Eu sou brasileiro, quero ver essa usina funcionando", disse. Em seguida, teria usado um discurso característico do governo: "O Brasil precisa de energia limpa. A obra da usina precisa voltar a funcionar, porque a sociedade está sendo prejudicada”.
O ministro-chefe da Secretaria Geral da Presidência, Gilberto Carvalho, destacado para a tarefa de costurar um amplo acordo reconhece o problema. “Em obras como Jirau e outras, em que trabalhadores ficam confinados nas matas, se não houver respeito ao pagamento de horas extras, se houver truculência das chefias e dos seguranças, se não houver condições de higiene e alimentação dignas, a eclosão da violência é algo inevitável”.
A grande preocupação do governo é com a proximidade da Copa do Mundo e das Olimpíadas, daí a necessidade de estabelecer regras mínimas para as grandes obras a serem cumpridas pelas empreiteiras.
O presidente da Força Sindical Paulo Pereira da Silva avalia que o problema não é tão simples. Segundo ele, tanto a Força como a CUT não têm experiência para lidar com multidões. "Naquela região de Jirau, construímos no máximo uma ponte ou um prédio, empregando no máximo mil pessoas. Estamos lidando com 20 mil", comentou.
Para o pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Divonzir Gusso, o país começou a pagar a conta pela enxurrada de obras que passou a realizar sem ter se preparado para isso. "Nem governo nem empresas estavam preparados e agora terão de trocar os pneus com o carro em alta velocidade", diz.
Jirau explica o modelo.
A expansão do capitalismo brasileiro avança fortemente para o Norte do país – é na região que se desenvolvem grandes projetos – construção de mega-hidrelétricas, abertura de rodovias, ampliação da exploração de minérios e expansão da pecuária.
A construção das hidrelétricas no Xingu, Madeira e Tapajós vem sendo apresentadas como imprescindíveis. O governo afirma que se trata de obras absolutamente necessárias e indispensáveis para suprir a crescente demanda de energia no país. “Sem as hidrelétricas o Brasil pára”, tem sido o discurso do Estado.
O governo brasileiro está absolutamente convencido de que o seu papel é induzir o crescimento da economia, função que exerce através do binômio “Estado financiador” e o “Estado investidor”. O “Estado financiador”, utilizando o BNDES e os fundos de pensão, exerce o papel de indutor do crescimento econômico fortalecendo grupos privados em setores estratégicos. Por outro, o “Estado investidor” financia mega-obras de infra-estrutura. No caso das usinas hidrelétricas vemos em ação o “Estado investidor” emprestando sua musculatura financeira para viabilizar as obras. No complexo Madeira, as obras contam com um financiamento do BNDES DE R$ 7,2 bilhões para Jirau e de $ 6,1 bilhões para Santo Antônio.
As grandes usinas são, portanto, compreensíveis a partir da concepção neo-desenvolvimentista que se aplica no país. O governo está absolutamente convencido de que esse é o melhor caminho para o país. Aliás, está convencido de que não há outro caminho. Jirau, nesse sentido explica o modelo em curso no país. Ainda mais, no caso específico da Amazônia o país reedita o caminho trilhado pelos militares.
O jornalista Glenn Switkes, coordenador da ONG International Rivers, em entrevista ao IHU em 2009 afirmava: “A visão de conquistar os rios da Amazônia com construção de grandes barragens é antiquada, obsoleta, que vem dos anos 1980, ou seja, é uma visão militar de ocupar a Amazônia e transformá-la numa estratégia econômica e política”.

Belo Monte vai na mesma perspectiva: “O que está em discussão não é só a usina de Belo Monte, mas o modelo de desenvolvimento que está por trás do projeto. O impressionante é que de alguma maneira o plano repete o modelo de ocupação visto no período militar”, afirma Rodrigo Timóteo da Costa e Silva, procurador do Ministério Público Federal em Altamira (PA).

As obras do Complexo Madeira desde o seu início foram polêmicas. Anunciada no governo Lula enfrentaram resistência. Contra ela se colocaram povos indígenas, ribeirinhos, ambientalistas e alguns movimentos sociais. Gilberto Cervisnki do Movimento dos Atingidos por Barragens – MAB destacava em 2007 que “construir as usinas no Madeira representa a abertura para construção de dezenas de outras hidrelétricas dentro da Amazônia, sem sequer discutir uma questão que entendemos ser fundamental: energia para quê? E para quem?".
Na opinião de Marco Antonio Trierveile, em entrevista ao IHU também em 2007, e também do MAB, o projeto do complexo Madeira atende a interesse “de grandes grupos econômicos interessados em aumentar sua exploração na Amazônia e em toda América Latina (recursos naturais, energia, minérios, madeira, terra, biodiversidade - principalmente para indústria financeira). Para que essas indústrias possam se instalar no País, elas precisam criar uma rede de infra-estrutura básica (energia, portos, hidrovias, redes de transmissão de energia, estradas, ferrovias), o que possibilitará a elas transportar mercadorias para fora do país”.
Para se opor à obra foi criado o movimento Rio Madeira Vivo que em seu manifesto de fundação alertava: “O rio Madeira e suas margens deixarão de atender ribeirinhos, indígenas e a população de Porto Velho com água, peixes, sedimentos e vida para se tornar um rio-mercadoria. Um rio morto, estéril, com águas podres, contaminado por mercúrio, multiplicador da malária. Um rio a serviço das indústrias eletrointensivas e do agronegócio, imprestável para o povo, para a pesca artesanal, para o lazer e para as culturas de várzea”.

A obra recebeu reiteradas objeções do Ibama que resistia em conceder a licença ambiental. Lula reclamou publicamente: "Tem que ter uma solução", disse ele à época. A irritação do presidente Lula com o que considerava entraves ambientais forçou mudanças no Ministério do Meio Ambiente e tempos depois resultaria no afastamento da ministra Marina Silva.

“Desrespeito, ilegalidade, destruição, desmatamento, essas são as marcas do compromisso do PAC com a Amazônia”. A afirmação da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira – COIAB em nota recente sobre os conflitos em Jirau revelam que a temática ambiental nunca encontrou eco no governo.
A questão ambiental
As hidrelétricas do Rio Madeira não são apenas um desastre social. Anunciam também um desastre ambiental. Essas grandes obras implicam em grandes inundações de terras, em significativos deslocamentos de pessoas e em devastação ambiental gigantesca.
Assim como o país tolerou em décadas passadas agressões ao meio ambiente – Itaipu, Balbina, Tucuruí, Transamazônica –, tudo leva a crer que caminhamos para outros erros. Assim como a nossa geração lamenta os erros cometidos pelas gerações anteriores, tudo indica que as gerações futuras lamentarão a decisão da construção de Jirau, Santo Antônio, Belo Monte...
Nesta perspectiva é que se pode afirmar que a questão ambiental não é estratégica no governo Dilma, como não foi no governo Lula. Apesar da intensa retórica, a temática ambiental ficou subordinada a agenda econômica. Pior ainda, a uma agenda econômica dependente de um padrão de desenvolvimento fordista. O Brasil permanece preso ao século XX, a uma concepção de industrialização tardia e tributária da Revolução Industrial.
O Brasil não apenas está preso ao mantra do crescimento econômico, como vem optando por um crescimento predatório. A cobiça e a avidez dos interesses econômicos estão comprometendo aquilo que é o diferencial para a qualidade da bios planetária: a biodiversidade. O país está perdendo o bonde da história e não percebe, ou não quer perceber, que é um dos poucos países que poderia oferecer uma alternativa à crise civilizacional, ancorada, sobretudo na crise climática. Nesta perspectiva, subordinar a biodiversidade da região amazônica ao produtivismo do sudeste e as plataformas de exportação de commodities é no mínimo uma opção questionável.

Revolta de Jirau não sensibiliza esquerda e ambientalistas
O pouco interesse que a revolta de Jirau provocou no debate da esquerda brasileira também é reveladora que parte dessa esquerda pensa da mesma forma que o governo. Setores majoritários da esquerda acreditam que o crescimento econômico é a varinha de condão para a resolução de todos os problemas. Particularmente da pobreza. A equação é conhecida. O crescimento econômico produziria um círculo virtuoso: produção-emprego-consumo.

Essa esquerda é tributária de uma intepretação marxista que se aproxima do liberalismo. Ambos – marxismo e liberalismo – bebem na fonte da racionalidade produtivista que vêem a natureza como fonte inesgotável de crescimento econômico. Essa concepção não se coaduna mais com a emergência da crise climática. “Não dá mais para fazer essa separação [da economia com o meio ambiente], alerta José Eli da Veiga. “As pessoas que continuam a separar economia e meio ambiente não entenderam nada”, diz ele.

Parte da esquerda não se dá conta de que embora a sociedade industrial ainda seja preponderante, a essência da forma de organizar a sua produção é empurrada cada vez mais para a periferia do núcleo propulsor do novo capitalismo – a economia do imaterial, a new economy, onde a biodiversidade assume uma nova dimensão.

Os ambientalistas, por outro lado, também deram pouca atenção para os acontecimentos de Jirau. Diferentemente de determinada esquerda que olha prioritariamente a questão social, muitos ambientalistas têm olhos apenas para a questão ambiental. Como a revolta de Jirau foi sobretudo uma questão social, não se viu as organizações ambientalistas repercutirem e se posicionarem sobre os fatos. Fosse um desastre ambiental que tivésse ocorrido em Jirau, qual teria sido a postura dos ambientalistas?

Se é um fato que a esquerda tradicional não conecta o social com o ambiental, também é um fato que parcela significativa do movimento ambientalista não articula o ambiental com o social.


(Envolverde/IHU On-Line)

segunda-feira, 26 de abril de 2010

Carta da Terra

CARTA DA TERRA

 
PREÂMBULO


Estamos num momento crítico da história da Terra, numa época em que a humanidade tem de escolher o seu futuro. À medida que o mundo se torna cada vez mais interdependente e frágil, o futuro encerra, ao mesmo tempo, grandes perigos e grandes promessas. Para avançar, devemos reconhecer que, no meio de uma magnífica diversidade de culturas e formas de vida, somos uma família humana, e uma só comunidade na Terra, com um destino comum. Devemos conjugar forças para gerar uma sociedade global sustentável, baseada no respeito pela natureza, nos direitos humanos universais, na justiça económica, e numa cultura da paz. Para alcançar este propósito, é imperativo que nós, os povos da Terra, declaremos a nossa responsabilidade uns para os outros, para com a grande comunidade da vida, e para com as gerações futuras.

Terra, a Nossa Casa

 
A humanidade é parte de um vasto universo em evolução. A Terra, a nossa casa, está viva como comunidade de vida única. As forças da natureza fazem da sobrevivência uma aventura exigente e incerta, mas a Terra providenciou as condições essenciais para a evolução da vida. A capacidade de recuperação das comunidades vivas, e o bem-estar da humanidade, dependem da manutenção de uma biosfera saudável em todos os seus sistemas ecológicos, uma enorme diversidade de plantas e animais, solos férteis, águas puras e ar limpo. O ambiente global com seus recursos não renováveis, é uma preocupação comum a todas as pessoas. A protecção da beleza, diversidade e vitalidade da Terra é um dever sagrado.



A Situação Global


Os padrões dominantes de produção e consumo estão a provocar a devastação dos ecossistemas, a redução drástica dos recursos, e uma explosiva extinção de espécies. As comunidades estão a ser minadas. Os benefícios do desenvolvimento não são partilhados equitativamente, e o fosso entre ricos e pobres aumenta colossalmente. A injustiça, a pobreza, a iletracia e os conflitos armados têm aumentado, e são a causa de muitos sofrimentos. O crescimento sem precedentes da população humana tem sobrecarregado os sistemas ecológicos e sociais.


As bases da segurança global estão ameaçadas. Essas tendências são perigosas mas evitáveis.



Desafios para o futuro



A escolha é nossa: formar uma aliança global para cuidar da Terra e uns dos outros, ou pôr em risco a nossa existência e a da diversidade da vida. São necessárias mudanças fundamentais nos nossos valores, instituições e modos de vida. Devemos entender que, quando as necessidades básicas estiverem ao alcance de todos, o desenvolvimento humano estará voltado, primariamente, a ser mais e não a ter mais. Temos o conhecimento e a tecnologia necessários para abastecer todos e reduzir os impactes sobre o ambiente. O crescimento de uma sociedade civil global está a criar novas oportunidades para construir um mundo democrático e humano. Os nossos desafios em questões ambientais, económicas, políticas, sociais e espirituais estão interligados, e juntos podemos estabelecer soluções que incluam todos estes aspectos.



Responsabilidade Universal

 
Para aceitarmos estas aspirações, devemos decidir viver com um sentido de responsabilidade universal, identificando-nos com toda a comunidade global, bem como com as nossas comunidades locais. Somos, ao mesmo tempo, cidadãos de nações diferentes e do mundo, no qual as dimensões local e global estão ligadas. Cada um partilha da responsabilidade pelo bem-estar actual, e o futuro da humanidade e de todo o mundo vivo. O espírito de solidariedade humana e de parentesco com todas as formas de vida é fortalecido quando vivemos com reverência pelo mistério da existência, com gratidão pelo dom da vida, e com humildade, considerando o lugar que ocupa o ser humano da Natureza.

Necessitamos urgentemente de uma visão conjunta de valores básicos, para proporcionar um fundamento ético à comunidade global emergente. Por isso, juntos na esperança, afirmamos os seguintes princípios, todos interdependentes, visando um modo de vida sustentável como objectivo comum, através dos quais a conduta de todos os indivíduos, organizações, empresas, governos e instituições transnacionais será guiada e avaliada.

 

PRINCÍPIOS

I. RESPEITAR E CUIDAR A COMUNIDADE DA VIDA

 
1. Respeitar a Terra e a vida em toda a sua diversidade.



a) Reconhecer que todos os seres estão interligados e que cada forma de vida tem valor, independentemente da sua utilidade para os seres humanos.



b) Afirmar a fé na dignidade inerente de todos os seres humanos e no potencial intelectual, artístico, ético e espiritual da humanidade.




2. Cuidar da comunidade da vida com compreensão, compaixão e amor.


a) Aceitar que, com o direito de possuir, administrar e usar os recursos naturais, vem o dever de impedir danos causados ao ambiente, e de proteger os direitos das pessoas.


b) Assumir que o aumento da liberdade, dos conhecimentos e do poder implica aumento da responsabilidade na promoção do bem comum.


3. Construir sociedades democráticas que sejam justas, participativas, sustentáveis e pacíficas.


a) Assegurar que as comunidades, a todos os níveis, garantam os direitos humanos e as liberdades fundamentais, e proporcionem a cada um a oportunidade de usar o seu potencial.


b) Promover a justiça económica e social, proporcionando a todos alcançar uma subsistência significativa e segura, que seja ecologicamente responsável.



4. Garantir as dádivas e a beleza da Terra para as atuais e as futuras gerações.
a) Reconhecer que a liberdade de acção de cada geração é condicionada pelas necessidades das gerações futuras.

b) Transmitir às futuras gerações valores, tradições e instituições que apoiem, a longo prazo, a prosperidade das comunidades humanas e ecológicas da Terra.


Para poder cumprir estes quatro grandes compromissos, é necessário:


II. INTEGRIDADE ECOLÓGICA


5. Proteger e repor a integridade dos sistemas ecológicos da Terra, com especial preocupação pela diversidade biológica, e pelos processos naturais que sustentam a vida.


a) Adoptar planos e estratégias de desenvolvimento sustentável, a todos os níveis, que façam com que a conservação ambiental e a reabilitação sejam parte integrante de todas as iniciativas de desenvolvimento.


b) Estabelecer e proteger de forma viável as reservas naturais e a biosfera, incluindo regiões selvagens e áreas marinhas, para proteger os sistemas de sustento à vida da Terra, manter a biodiversidade e preservar a nossa herança natural.


c) Promover a recuperação de espécies e de ecossistemas ameaçados.


d) Controlar e erradicar organismos não-nativos ou geneticamente modificados que causem dano às espécies nativas, ao ambiente, e prevenir a introdução desses organismos.


e) Gerir o uso de recursos renováveis como a água, o solo, os produtos florestais e vida marinha de uma forma que não ultrapasse as taxas de regeneração e que protejam a saúde dos ecossistemas.


f) Gerir a extracção e o uso de recursos não-renováveis, como minerais e combustíveis fósseis por forma a que diminuam a exaustão e não causem dano ambiental grave.

 
6. Prevenir os impactes negativos para o ambiente como o melhor método de proteção ambiental e, quando o conhecimento for limitado, assumir uma abordagem de precaução.


a) Orientar acções para evitar a possibilidade de sérios ou irreversíveis danos ambientais, mesmo quando a informação científica for incompleta ou inconclusiva.


b) Impor o ónus da prova àqueles que afirmarem que a actividade proposta não causará dano significativo, e responsabilizar as partes pelos danos causados no ambiente.


c) Garantir que a decisão a ser tomada se oriente pelas consequências humanas globais, cumulativas, de longo prazo, indirectas e de longo alcance.


d) Impedir a poluição de qualquer parte do ambiente, e não permitir o aumento de produção de substâncias radioactivas, tóxicas ou outras substâncias perigosas.


e) Evitar que o ambiente seja danificado por actividades militares.




7. Adotar padrões de produção, consumo e reprodução que protejam as capacidades regenerativas da Terra, os direitos humanos e o bem-estar comunitário.


a) Reduzir, reutilizar e reciclar materiais usados nos sistemas de produção e consumo e garantir que os resíduos possam ser assimilados pelos sistemas ecológicos


b) Atuar com restrição e eficiência em relação ao consumo energético e recorrer cada vez mais aos recursos energéticos renováveis, como a energia solar e a eólica.


c) Promover o desenvolvimento, a adoção e a transferência equitativa de tecnologias ambientais seguras.


d) Incluir totalmente os custos ambientais e sociais de bens e serviços no preço de venda, e habilitar os consumidores a identificar produtos que satisfaçam as mais altas normas sociais e ambientais.


e) Garantir acesso universal aos cuidados médicos que fomentem a saúde reprodutiva e a reprodução responsável.


f) Adoptar modos de vida que acentuem a qualidade de vida e a subsistência material num mundo finito.


8. Desenvolver o estudo da sustentabilidade ecológica e promover a permuta aberta e a ampla aplicação do conhecimento adquirido.


a) Apoiar a cooperação científica e tecnológica internacional relacionada com a sustentabilidade, com especial atenção às necessidades das nações em desenvolvimento.


b) Reconhecer e preservar os conhecimentos tradicionais e a sabedoria espiritual, em todas as culturas, que contribuam para a protecção ambiental e o bem-estar humano.


c) Garantir que informações de vital importância para a saúde humana e para a protecção ambiental, incluindo informação genética, estejam disponíveis no domínio público.




III. JUSTIÇA SOCIAL E ECONÓMICA



9. Erradicar a pobreza como um imperativo ético, social e ambiental.

a) Garantir o direito à água potável, ao ar puro, à segurança alimentar, aos solos não contaminados, ao abrigo e saneamento seguro, distribuindo os necessários recursos nacionais e internacionais.

b) Proporcionar educação e recursos a cada ser humano, para assegurar uma subsistência sustentável, e proporcionar segurança social, e rendimentos sociais a todos aqueles que não capazes de manter-se por conta própria.

c) Reconhecer os ignorados, proteger os vulneráveis, servir aqueles que sofrem, e permitir-lhes desenvolver as suas capacidades e alcançar as suas aspirações.

10. Garantir que as actividades e instituições económicas, a todos os níveis, promovam o desenvolvimento humano de forma equitativa e sustentável.

a) Promover a distribuição equitativa da riqueza internamente e entre as nações.

b) Promover o desenvolvimento dos recursos intelectuais, financeiros, técnicos e sociais das nações em desenvolvimento, e isentá-las de dívidas internacionais onerosas.

c) Garantir que todas as transacções comerciais apoiem o uso de recursos

sustentáveis, a protecção ambiental e normas laborais progressistas.

d) Exigir que corporações multinacionais e organizações financeiras internacionais atuem com transparência em benefício do bem comum, e responsabilizá-las, pelas consequências das suas atividades.

11. Afirmar a igualdade e a equidade entre sexos como pré-requisito para o desenvolvimento sustentável e assegurar o acesso universal à educação, assistência na saúde e às oportunidades económicas.

a) Assegurar os direitos humanos das mulheres e das jovens e acabar com toda a violência contra elas.

b) Promover a participação ativa das mulheres em todos os aspectos da vida econômica, política, civil, social e cultural, como parceiras plenas e paritárias, decisoras, líderes e beneficiárias.

c) Fortalecer as famílias, e garantir a segurança e a educação de todos os membros da família.

12. Defender, sem discriminação, os direitos de todas as pessoas a um ambiente natural e social capaz de assegurar a dignidade humana, a saúde corporal e o bem-estar psíquico, concedendo especial atenção aos direitos dos povos indígenas e das minorias.

a) Eliminar a discriminação em todas as suas formas, como baseadas em raça, cor, sexo, orientação sexual, religião, idioma e origem nacional, étnica ou social.

b) Afirmar o direito dos povos indígenas à sua espiritualidade, educação, terras e recursos, assim como às suas práticas, relacionadas com formas sustentáveis de vida.

c) Honrar e apoiar os jovens das nossas comunidades, habilitando-os a cumprir o seu papel essencial na criação de sociedades sustentáveis.

d) Proteger e restaurar lugares notáveis pelo significado cultural e espiritual.


14. Integrar, na educação formal e na aprendizagem ao longo da vida, os conhecimentos, valores e capacidades necessárias para um modo de vida sustentável.

a) Oferecer a todos, especialmente às crianças e aos jovens, oportunidades de educação que lhes permitam contribuir activamente para o desenvolvimento sustentável.

b) Promover a contribuição das artes e humanidades, assim como das ciências, na Educação para a sustentabilidade.

c) Intensificar o papel dos média no sentido de aumentar a sensibilização para os desafios ecológicos e sociais.

d) Reconhecer a importância da educação moral e espiritual para uma subsistência sustentável.

15. Tratar todos os seres vivos com respeito e consideração

a) Impedir maus tratos aos animais integrados em sociedades humanas e protegê-los de sofrimentos.

b) Proteger animais selvagens de métodos de caça, armadilhas e pesca, que causem sofrimento extremo, prolongado ou evitável.

c) Eliminar ou evitar até ao máximo possível a captura ou destruição de espécies não visadas.

16. Promover uma cultura de tolerância, não violência e paz

a) Estimular e apoiar o entendimento mútuo, a solidariedade e a cooperação entre todas as pessoas, internamente e entre as nações.

b) Implementar estratégias amplas para prevenir conflitos armados e usar a colaboração na resolução de problemas para manejar e resolver conflitos ambientais e outras disputas.

c) Desmilitarizar os sistemas de segurança nacional até chegar ao nível de uma postura não-provocativa da defesa, e converter os recursos militares em propósitos pacíficos, incluindo restauração ecológica.

d) Eliminar armas nucleares, biológicas e tóxicas e outras armas de destruição em massa.

e) Assegurar que o uso do espaço orbital e cósmico mantenha a protecção ambiental e paz.

g) Reconhecer que a paz é a plenitude criada por relações correctas consigo mesmo, com outras pessoas, outras culturas, outras vidas, com a Terra e com a universalidade da qual somos parte.

 
O CAMINHO EM FRENTE

 
Como nunca antes na história, o destino comum chama-nos para encontrar um novo começo. Tal renovação é a promessa dos princípios da Carta da Terra. Para cumprir esta promessa, temos que nos comprometer a adoptar e promover os valores e objectivos da Carta.

Isto requer uma mudança na mente e no coração. Requer um novo sentido de interdependência global e de responsabilidade universal. Devemos desenvolver e aplicar com imaginação a visão de um modo de vida sustentável aos níveis local, nacional, regional e global. A nossa diversidade cultural é uma herança preciosa, e diferentes culturas encontrarão as suas próprias e distintas formas de concretizar esta visão. Devemos aprofundar e expandir o diálogo global gerado pela Carta da Terra, porque temos muito que aprender a partir da busca iminente e conjunta pela verdade e pela sabedoria.

A vida muitas vezes envolve tensões entre valores importantes. Isto pode significar escolhas difíceis. Porém, necessitamos encontrar caminhos para harmoniosamente conjugar diversidade com unidade, o exercício da liberdade com o bem comum, objectivos de curto prazo com metas de longo prazo. Todo o indivíduo, família, organização e comunidade têm um papel vital a desempenhar. As artes, as ciências, as religiões, as instituições educativas, os meios de comunicação, as empresas, as organizações não-governamentais e os governos são todos chamados a oferecer uma liderança criativa. A parceria entre governo, sociedade civil e empresas é essencial para uma governabilidade eficaz.

Para construir uma comunidade global sustentável, as nações do mundo devem renovar o seu compromisso com as Nações Unidas, cumprir as suas obrigações respeitando os acordos internacionais existentes e apoiar a implementação dos princípios da Carta da Terra como um instrumento internacional legalmente unificador quanto ao ambiente e ao desenvolvimento.

 
Que o nosso tempo seja lembrado pelo despertar de uma nova veneração face à vida, pelo compromisso firme de alcançar a sustentabilidade, a intensificação da luta pela justiça e pela paz, e a alegre celebração da vida.

 
Para mais informações - http://www.cartadaterrabrasil.org



quarta-feira, 7 de abril de 2010

Leonardo Boff

06/04/2010 - 11h04



O princípio ganha-ganha
Por Leonardo Boff*


Se olharmos o mundo como um todo, percebemos que quase nada funciona a contento. A Terra está doente. E como somos, enquanto humanos, também Terra (homem vem de humus), nos sentimos também, de certa forma, doentes.
Parece-nos evidente que não podemos prosseguir nesse rumo pois nos levaria a um abismo. Fomos tão insensatos nas últimas gerações que construimos o princípio de auto-destruição acrescido pelo aquecimento global irreversível. Isso não é fantasia holywoodiana. Entre estarrecidos e perplexos, nos perguntamos: como chegamos a isso? Como vamos sair desse impasse global? Que colaboração cada um pode dar?
Em primeiro lugar, há de se entender o eixo estruturador da sociedade-mundo, principal responsável por esse curso perigoso. É o tipo de economia que inventamos com a cultura que a acompanha que é de acumulação privada, de consumismo não solidário a preço da pilhagem da natureza. Tudo é feito mercadoria para a troca competitiva. Nessa dinâmica só o mais forte ganha, Os outros perdem ou se agregam como sócios subalternos ou desaparecem. O resultado desta lógica da competição de todos contra todos e da falta de cooperação é a transferência fantástica de riqueza para poucos fortes, os grandes conglomerados a preço do empobrecimento geral.


Mas há que reconhecer: por séculos, essa troca competitiva conseguia abrigar a todos, bem ou mal, sob seu guarda-chuva. Criou mil facilidades para a existência humana. Mas hoje, as possibilidades deste tipo de economia estão se esgotando como o evidenciou a crise econômico-financeira de 2008. A grande maioria dos países e das pessoas se encontram excluidas. O próprio Brasil não passa de um sócio subalterno dos grandes, com a função a ele reservada de ser um exportador de matérias primas e não um produtor de inovações tecnológicas que lhe dariam os meios para moldar seu próprio futuro. Não nos descolonizamos ainda totalmente.


Ou mudamos ou a vida na Terra corre risco. Onde buscar o princípio articulador de uma outra forma de vivermos juntos, de um novo sonho para frente? Em momentos de crise total e estrutural precisamos consultar a fonte originária de tudo: a natureza. Ela nos ensina, o que as ciências da Terra e da vida já há muito nos estão dizendo: a lei básica do universo, não é a competição que divide e exclui, mas a cooperação que soma e inclui. Todas as energias, todos os elementos, todos os seres vivos, das bactérias aos seres mais complexos, são interdependentes. Uma teia de conexões os envolve por todos os lados, fazendo-os seres cooperativos e solidários, conteúdo maior do projeto socialista. Por causa desta teia chegamos até aqui e poderemos ter futuro para frente.


Aceito este dado, temos condições de formular uma saída para as nossas sociedades. Ha que se fazer conscientemente da cooperação, um projeto pessoal e coletivo, coisa que não se viu em Copenhague na COP-15 sobre o clima. Ao invés da troca competitiva onde só um ganha e os demais perdem, devemos fortalecer a troca complementar e cooperativa, o grande ideal dos andinos do "bem viver"(sumak kawsay) pelo qual todos ganham porque todos participam. Importa assumir o que a mente brilhante do Nobel de matemática John Nesh formulou: o princípio do ganha-ganha, pelo qual todos dialogando e cedendo saem beneficiados sem haver perdedores.
Para conviver humanamente inventamos a economia, a política, a cultura, a ética e a religião. Mas desnaturamos estas realidades "sagradas" envenenando-as com a competição e o individualismo, dilacerando assim o tecido social.


A nova centralidade social e a nova racionalidade necessária e salvadora está fundada na cooperação, no pathos, no sentimento profundo de pertença, de familiaridade, de hospitalidade e de irmandade com todos os seres. Se não fizermos essa conversão, preparemo-nos para o pior.


*Leonardo Boff é autor de Cuidar da Terra - salvar a vida a sair pela Record (2010).
(Envolverde/O autor)

domingo, 19 de agosto de 2007

PACTO AMAZÔNICO- HITÓRICO

Fundada em 2003 a ONG PACTO AMAZÔNICO vem atuando incansávelmente na promoção da Organização Social das comunidades amazônicas de baixa renda - Associativismo/Cooperativismo, promovendo o empoderamento para o desenvolvimento sustentável no Sul do Amazonas. Com sede em Humaitá, sua equipe multidisciplinar, formada por Assistente Social,Economista,Pedagoga,Técnicos Agricolas,Redatora,Biológa entre outros colaboradores em várias áreas, passou a promover o resgate da cultura local e o assessoramento para projetos comunitários participativos.